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Vamos pensar juntos

Site: Instituto Multidisciplinar de Formação Humana com Tecnologias
Curso: Construção do Texto - Estratégias para a Comunicação Oral e Escrita - TURMA 2
Livro: Vamos pensar juntos
Impresso por: Usuário visitante
Data: quinta-feira, 21 nov. 2024, 22:52

Descrição

Vamos pensar juntos

1. Uma leitura

Agora que já fizemos uma prévia de nossa discussão, vamos dar continuidade a ela com a leitura do texto a seguir. 

Comunicação

Luis Fernando Veríssimo

É importante saber o nome das coisas. Ou, pelo menos, saber comunicar o que você quer. Imagine-se entrando numa loja para comprar um... um... como é mesmo o nome?

– Posso ajudá-lo, cavalheiro?

– Pode. Eu quero um daqueles, daqueles...  

– Pois não?

– Um... como é mesmo o nome?

– Sim?

– Pomba! Um ... um... Que cabeça a minha. A palavra me escapou por completo. É uma coisa simples, conhecidíssima.

 – Sim, senhor.

– O senhor vai dar risada quando souber.

– Sim, senhor.

– Olha, é pontuda, certo?

– O quê, cavalheiro?

– Isso que eu quero. Tem uma ponta assim, entende? Depois vem assim, assim, faz volta, aí vem reto de novo, e na outra ponta tem uma espécie de encaixe, entende?  Na ponta tem outra volta, só que esta é mais fechada. E tem um... um... Uma espécie de... como é que se diz? De sulco. Um sulco onde encaixa a outra ponta, a pontuda, de sorte que o, a, o negócio, entende, fica fechado. É isso. Uma coisa pontuda que fecha. Entende?

– Infelizmente, cavalheiro...

– Ora você sabe do que estou falando.

– Estou me esforçando mas...

– Escuta. Acho que não podia ser mais claro. Pontudo numa ponta, certo?

– Se o senhor diz, cavalheiro.

– Como, eu digo? Isso já é má vontade. Eu sei que é pontudo numa ponta. Posso não saber o nome da coisa, isso é um detalhe. Mas sei exatamente o que eu quero.

 – Sim senhor. Pontudo numa ponta.

– Isso. Eu sabia que você compreenderia. Tem?

– Bom, eu preciso saber mais sobre o, a, essa coisa. Tente descrevê-la outra vez. Quem sabe o senhor desenha para nós?

– Não. Eu não sei desenhar nem casinha com fumaça saindo da chaminé. Sou uma negação em desenho.

– Sinto muito.

– Não precisa sentir. Sou técnico em contabilidade, estou muito bem de vida. Não sou um débil mental. Não sei desenhar, só isso. E hoje, por acaso, me esqueci do nome desse raio. Mas fora isso, tudo bem. O desenho não me faz falta. Lido com números. Tenho algum problema com os números mais complicados, claro. O oito por exemplo. Tenho que fazer um rascunho antes. Mas não sou débil mental, como você está pensando.

– Eu não estou pensando nada, cavalheiro.

– Chame o gerente.

– Não será preciso, cavalheiro. Tenho certeza de que chegaremos a um acordo. Essa coisa, que o senhor quer, é feita do quê?

– É de, sei lá. De metal.

– Muito bem. De metal. Ela se move?

– Bem... É mais ou menos assim. Presta atenção nas minhas mãos. É assim, assim, dobra aqui e encaixa na ponta, assim.

– Tem mais uma peça? Já vem montado?

– É inteiriço. Tenho quase certeza de que é inteiriço.

– Francamente...

 – Mas é simples! Uma coisa simples. Olha: assim, assim, uma volta aqui, vem vindo, vem vindo, outra e clique, encaixa.

 – Ah, tem clique. É elétrico.

– Não! Clique, que eu digo, é o barulho de encaixar.

– Já sei.

– Ótimo.

– O senhor quer uma antena externa de televisão.

– Não! Escuta aqui. Vamos tentar de novo...

– Tentemos por outro lado. Para que serve?

–Serve assim para prender. Entende? Uma coisa pontuda que prende. Você enfia a ponta pontuda por aqui, encaixa a ponta no sulco e prende as duas partes de uma coisa.

– Certo. Esse instrumento que o senhor procura funciona mais ou menos como um gigantesco alfinete de segurança e...

 – Mas é isso!É isso! Um alfinete de segurança!

– Mas do jeito que o senhor descrevia parecia uma coisa enorme, cavalheiro!

– É que eu sou meio expansivo. Me vê aí um... um... Como é mesmo o nome?

  Fonte: VERISSIMO, Luis Fernando. Comunicação.
In:
Para gostar de ler, v.7. 3. ed. São Paulo: Ática, 1982. p. 35-37.

2. Após a leitura do texto...

Após a leitura do texto, vamos pensar juntos...

  • Que estratégias o protagonista do texto utiliza para tentar se comunicar com o vendedor?
  • A comunicação foi efetivada?
  • O que isso nos mostra a respeito dos  elementos que utilizamos para nos comunicar? 

O texto nos mostra que o primeiro passo para efetivar um processo de comunicação é definir nossa intenção comunicativa. Vamos saber mais sobre isso.

3. A interação comunicativa

Por intenção comunicativa compreende-se a necessidade de expressar uma ideia, com um determinado objetivo, utilizando um determinado veículo. No caso da comunicação verbal, esse veículo são as palavras.

O processo de comunicação envolve os seguintes elementos:

  • Emissor – aquele que tem a intenção comunicativa;
  • Receptor – aquele a quem se dirige a mensagem;
  • Mensagem –  a informação transmitida;
  • Código – os signos utilizados para a transmissão da mensagem;
  • Canal –  por onde a mensagem é transmitida;
  • Contexto ou referente – a situação à qual a mensagem se refere

4. O processo de transmissão da mensagem

Percebemos que qualquer intenção comunicativa envolve um complexo processo de transmissão da mensagem. Por essa razão, é imprescindível que emissor e receptor dominem o código no qual ela é construída, sob pena de se perder, no meio do processo, a essência de seus significados. É importante lembrar, também, que o referente, ou contexto, por ser a situação a que a mensagem se refere, interfere fortemente no entendimento do que se pretende comunicar, pois, nesse momento, a vivência de cada um dos envolvidos no processo estabelece formas variáveis de compreensão.

5. A comunicação efetiva

Levando em conta a importância da comunicação verbal em todas as áreas de nossas vidas, não podemos deixar de ressaltar a necessidade de se conhecer e dominar o código verbal da sociedade na qual nos inserimos – no nosso caso, a Língua Portuguesa.

Conhecer, contudo, as regras gramaticais da língua não é suficiente para se atingir a comunicação plena. É preciso compreender de que maneira nos tornamos usuários proficientes e eficientes da língua e, para isso, é necessário lidar com alguns conceitos ligados às estratégias textuais. Além disso, é imprescindível que se saiba como ser eficaz na comunicação.

6. A eficácia do ato comunicativo

Em todas as instâncias de nossa vida, buscamos, sempre, compreender o que se passa a nossa volta e fazer com que aqueles que nos cercam nos compreendam. Apesar de todo esse esforço, nem sempre a comunicação se dá de forma tranquila. Ouvimos, com frequência, que em determinada situação houve um “problema de comunicação.” Mas se falamos a mesma língua, vivemos no mesmo lugar, temos hábitos semelhantes, por que esses problemas acontecem?

A verdade é que as relações humanas estão calcadas nessa necessidade de compreensão mútua, e só é possível sustentar essas relações se dominamos os meios e os elementos necessários para adquirir e passar informações – seja sobre nós mesmos, seja sobre o que sabemos, seja sobre o que sentimos.

7. Problemas no entendimento

Isso, contudo, não é tão fácil quanto parece. Não é incomum termos problemas com uma situação de mau entendimento daquilo que quisemos dizer. Falamos ou escrevemos com a certeza de que estamos sendo absolutamente claros em nossa intenção comunicativa, mas, por alguma razão, nosso interlocutor não consegue interagir conosco. O que deu errado? Com certeza, não fomos eficazes em nossa comunicação. O processo de comunicação pressupõe o seguinte percurso:

Assim, nossa intenção comunicativa é o início do processo de comunicação. Se ela for compreendida pelo interlocutor, a comunicação foi eficaz. Do contrário, podemos dizer que houve um ruído.

Ruído é tudo aquilo que atrapalha ou mesmo impede a comunicação.

O ruído pode ser:

  •  Físico  barulho no ambiente, odores, desconforto físico
  •  Cultural diferenças vocabulares e socioculturais
  •  Psicológico postura do emissor, incluindo falta de clareza 


A comunicação não acontece

8. Parece piada

Um bom exemplo de ruído na comunicação é o uso de termos sabidamente desconhecidos pelo interlocutor, com o objetivo de criar sobre ele uma situação de ascendência e dominação. Quer ver um exemplo divertido?

Fonte: Jurisdiquês no banco dos réus.
Disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=10951

9. Agora, pense

Diante das frases retiradas de processos jurídicos, algumas pessoas simplesmente desistem de levar a leitura adiante. Outras buscam o significado das palavras em dicionários, mas acabam esbarrando em termos arcaicos, já em desuso.

Agora, pense:

  • Qual o efeito de textos como esses sobre o interlocutor?
  • Levando em conta os termos utilizados, como podemos compreender a intenção comunicativa do emissor?
  • Existe comunicação? 

É claro que o processo de comunicação, em situações como a retratada acima, fica totalmente comprometido. Contudo, nesse caso específico, existe uma outra intenção para além da eficácia comunicativa: o uso da língua como exercício de poder.

Vamos, então, a nossa reflexão:

A partir das informações dadas nesta aula, poste em nosso fórum Discussões sobre o tópico 3 seu ponto de vista sobre a reflexão proposta.